terça-feira, 11 de outubro de 2011

O meu método de desforra

O meu método de desforra consiste em mandar, o mais rápido possível, uma atitude inteligente atrás de uma burrice: assim, talvez a mesma ainda possa ser alcançada. Para falar numa comparação: eu mando um pote de confeites para me livrar de uma história azeda... Basta que me façam algo de mau, que eu vou à "desforra" por causa disso, isso é certo: em pouco tempo encontro uma oportunidade de expressar meu agradecimento ao "malfeitor" (inclusive agradecendo-lhe o mal-feito) – ou de pedir algo a ele, o que pode ser mais cortês do que dar alguma coisa... A carta mais grosseira, ainda é mais bondosa, mais honesta do que o silêncio. Àqueles que silenciam quase sempre lhes falta algo em fineza e polidez de coração; silenciar é uma falta objeção; engolir sapos faz, irremediavelmente, um mau caráter – e inclusive estraga o estômago... Todos aqueles que silenciam são dispépticos. – Vede bem, eu não pretendo ver a grosseria sendo desprezada, ela é, de longe, a forma mais humana da objeção e, em meio à suavização moderna, uma de nossas maiores virtudes. Se a gente é rico o suficiente, é até mesmo uma ventura não ter razão. Um deus, que viesse à terra, por certo não haveria de fazer nada a não ser injustiças – tomar não o castigo, mas sim a culpa sobre as costas, isso é que seria divino.
 
 
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Ecce Homo: de como a gente se torna o que a gente é. Porto Alegre: L&PM, 2002. 208 p. 17 cm

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