Contra a evidência dos corpos mortos, imagina fantasmas, demônios. Chega ao extremo de imaginar uma entidade supracorpórea - a alma - e a separar a individualidade em alma e corpo. As idéias de vida após a morte, seja a da transmissão ou da reencarnação, ou ainda a da eternidade da alma, tira da morte o significado de término de vida e se transformam em uma convenção da civilização. O homem se convence da sua imortalidade. Mas não é só isso. Para além da ambiguidade de sentimentos entre a morte do inimigo e a do ser amando, Freud chama a atenção para uma ambivalência de sentimentos do homem primitivo, mas subjacente no homem civilizado, em relação à morte. Cada ser amado faz parte de nós, do nosso ego. Quando morre, mata em nós essa parte. Mas cada pessoa, mesmo amada, é outro ser, com alguma coisa estranha e hostil. Nasce dessa ambivalência ante a morte do ser amado, que, simultaneamente, somos nós e é um estranho, um sentimento de culpa que torna impronunciável, ou pelo menos de mal gosto, a idéia de morte.
Freud, 1968 apud THIRTY-CHERQUES, Hermano Roberto. Sobreviver ao trabalho. Rio de Janeiro: FVG, 2004. p. 17
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